segunda-feira, 5 de março de 2018

Memética que troço é esse? II

Quando um cientista deseja fazer ciência, enfia-se em seu laboratório, mede, pesa, dilui, etc e trás fatos, enuncia leis, etc Quando quer filosofar...

Imita Werner Heisenberg, cujas palavras achamos por bem reproduzir:

"Desde muito cedo tive a oportunidade de ler Platão; já na escola o traduzíamos. A seguir li os seus diálogos; o Timeu, principalmente, exerceu grande influência sobre mim, pois foi na altura em que se me deparou a teoria do átomo. Desde então tenho indagado se se pode compreender a teoria atômica sem se fazer uso da Filosofia, e cheguei a conclusão de que o atomismo esta tão afastado do nosso mundo quotidiano que, sem uma análise pormenorizada da situação epistemológica, linguística e, em geral, dos fundamentos filosóficos, é impossível compreender a teoria do átomo... Precisamente nessa altura deparou-se-me, casualmente, o Timeu e a história do átomo, que me provocaram profunda impressão... Depois voltei a discutir frequentemente com amigos interessados em tema filosóficos sobre os problemas que se expõem no Timeu. Essa leitura desempenhou um papel bastante importante na minha vida." in Horia, Vintila 'Viagem aos centros da terra' Verbo p 283 e sg

Já nos referimos, no artigo anterior, ao conhecimento de Sagan a respeito deste ramo do conhecimento que é a Filosofia. Poderíamos citar ainda Weizsacker, o qual repassou diversos destes temas numa de suas obra. Assim "A parte e o todo" de Heisenberg, o qual se bem me lembro também é autor de 'Física e filosofia'.

O que no entanto nenhum deles fez foi vender suas especulações ou apreciações filosóficas como ciência 'empírica'...

Outro porém e bem outro é o caso do Dr Dawkins, com sua extravagante hipótese sobre 'Genes egoístas' cuja intencionalidade egoística controla os seres humanos como máquinas, privando-os de auto determinação ou livre arbítrio. Genes colonizam-nos para replicarem-se... Somos obras não de um deus, mas de uma luta épica entre genes brigões que lutam pela sobrevivência...

Não foi sem razão que diversos de seus pares, cito de passagem apenas S Jay Gould, apresentaram-no como mistificador. Mas... a obra agradou o grande público leigo, o qual nem deseja ser livre e consequentemente responsável e que deseja ver o próprio individualismo ou egoísmo justificado. O grande público adorou o que leu como adora este Velho testamento que determina a matança de cananeus e o Corão com sua jihad, murtad, Djzia e sharia enfim... A parte mais primitiva, grosseira e vulgar da humanidade aspira derramar sangue, roubar, mentir, permanecer insensível as necessidades do outro, etc E Dawkins justifica 'biologicamente' tudo isto...

Maomé, Lutero, Calvino, Spencer, Hamilton, Wilson, Desmond Morris ( o da 'Fauna humana' e do 'Macaco nu'), Hitler, Staline, Von Mises, Hayeck, Friedman, e Dawkins não podia ter deixado de fazer o imenso sucesso que tem feito uma vez que disseram as massas barbarizadas o que queriam ouvir, sancionando o comportamento delas... Outro e bem outo é o caso dos 'censores' Sócrates, Platão, Jesus, Buda, Confúcio, etc os quais buscaram corrigir a moralidade baixa da plebe e eleva-la... A humanidade finge adorar ou cultuar a estes, mas continua vivendo segundo a norma e regra daqueles...

E no entanto este mesmo Dawkins, parece até piada, não só declara que seu biologismo ateísta produzirá (tempo futuro é claro) uma boa fornada de 'Ética' - Acredita quem quer... como chegou a dizer que 'Devemos tentar ensinar a generosidade e o altruísmo...' Flew 88. Mas como Dr Dawkins? Se somos máquinas comandadas por genes egoístas? Como se segundo a equação de William Hamilton só podemos ser altruístas face a nosso próprio patrimônio genético?

No entanto a escolástica genético darwinista de Dawkins não para por aqui... pois além de genes possessivos temos memes???

HHHHHHaaaaaaannnnnnn???

O que?

Sim temos memes... Segundo Dawkins.

Mas que são memes???

Começarei declarando, pois quero começar do começo, ou melhor dizendo parafraseando Marilynn Robinson ("Além da razão" Nova Fronteira 2011 p 67) e apresentando os memes como algo puramente hipotético ou imaginário, i é, algo cuja existência não pode ser concretamente demonstrado, em contraposição aos genes, cuja existência, é real e para além que qualquer dúvida.

Genes são materiais, são moléculas e como tais foram isolados e 'verificados' pelos cientistas. Memes é coisa que ninguém, jamais viu ou isolou...

Uma bela construção fantasiosa, digo ideal, do biólogo inglês, apenas isto. Os genes estão no meu corpo, no seu corpo, nos nossos corpos... Os memes na cabecinha ou na imaginação de Richard Dawkins, donde passaram a seus 'Best sellers'...

Pior, mais grave... monstruoso. Memes são entidades ideais, imateriais, supra físicas, implantadas por um biólogo materialista no organismo humano.

Dawkins meus bons amigos é materialista professo, e, como tal, deveria enunciar apenas a existência de entidades materiais ou físicas, o que alias se espera de qualquer biólogo... Mas, enuncia, a existência de 'ideias' ou 'conceitos' que criam raízes materiais no cérebro. Não, não são uns genes que portam ideias, aqui teríamos genes pensantes - o que Dawkins explicitamente ao menos não ousa enunciar - mas umas ideias que são comunicadas externamente ou um produto da cultura que internalizando-se, implanta-se materialmente no organismo. Ideias literalmente fixas de que não pode o infectado libertar-se, permanecendo eternamente escravo delas.

Não vou entrar neste 'samba do crioulo doido' mas, ainda aqui, reproduzir as palavras da Sra Robinson:

"Por analogia com o gene, esta entidade ou fenômeno é chamada meme. O meme é um conceito, uma ideia, uma memória pessoal ou cultura EGOÍSTA que coloniza o cérebro e que sobrevive por meio da proliferação, implantando-se noutros cérebros. Dawkins diz: 'Exemplos de memes são melodias, ideias, frases feitas, modas indumentariais, formas de fazer vasos ou construir arcos. Assim como os genes se propagam no pool genético, saltando de um corpo a outro por meio de espermatozoides e óvulos, os memes se propagam no pool de memes, saltando de um cérebro a outro através de um processo que, em sentido amplo pode ser chamado de imitação.'. Ele cita seu colega N K Humphrey 'Memes deve ser considerados ESTRUTURAS VIVAS NÃO APENAS METAFÓRICA, MAS TECNICAMENTE. Ao plantar um meme fértil em minha mente, VOCÊ LITERALMENTE PARASITA MEU CÉREBRO, transformando-o em veículo para a propagação desse meme da mesma maneira como um vírus pode parasitar o mecanismo genético de uma célula hospedeira. E isso NÃO É FORÇA DE EXPRESSÃO - o meme para, digamos 'a crença na vida após a morte' é de fato construído fisicamente, milhões de vezes, COMO UMA ESTRUTURA NO SISTEMA NERVOSO DO HOMEM, individualmente, por todo mundo." Opus cit ps 65 e sg

Peço 'data vênia' para fazer uma citação deste tamanho, mas era necessário, para que depois não digam que estamos torcendo ou falsificando as doutrinas do sr Dawkins, pois é comum ver seus seguidores repetindo esta disputa esfarrapada...

Temos ideias, crenças, modas, conceitos, etc que vagam ou giram por ai, como o vírus da gripe, no mundo da cultura. E ai você nasce num ambiente infectado destes e contrai lá o meme do budismo, ou do espiritismo, ou do Catolicismo, ou do Socratismo, ou do Socialismo... e ele, mesmo sendo puramente conceitual, cria ou desenvolve raízes materiais ou celulares no seu cérebro, formando como que um quisto irremovível. Como se vê, até aqui, nada de livre arbítrio, de racionalidade, de lógica, de reflexão... Nada disto é real, apenas os conceitos 'voadores' que batem a nossa testa e infectam-nos para todo sempre???

Somos quase que levados a crer no meme pela doutrina do meme. Pois só mesmo um palerma para endossar semelhante disparate quando toda gente propriamente instruída e educada é por assim dizer 'Uma metamorfose ambulante' pelo simples fato de rever seus costumes, princípios, valores, ideias e crenças ao cabo de toda vida. Pessoas mudam de ideias, mesmo as mais simples e estupidas mudam de ideias senhor biólogo!

Outro conteúdo implícito na exótica doutrina do sr Dawkins, e pelo qual ela é um tiro no pé, é que pessoas controladas ou colonizadas por memes não pesam evidências ou argumentos, e tampouco os próprios memes... Memes são ideias introjetadas no sujeito sem que ele mesmo tome consciência disto. O que destrói pela base a distinção fundamental entre Verdade e Erro... Pois só podemos falar em verdade e erro quando o sujeito em posse de uma vida racional, pesa os argumentos buscando pela evidência... Quando é colonizado por conceitos voláteis que lhe penetram o crânio, como que por osmose não há mais verdade e erro...

Pelo que temos de nos perguntar sobre os memes do materialismo, do ateísmo, do positivismo, do cientificismo, etc Afinal se há memes como alguns privilegiados poderiam ter acesso a qualquer Verdade que ultrapasse os tais memes??? Tudo é meme, e se tudo é meme, nosso estado comum deve ser de ignorância crassa no que diz respeito a realidade... ou temos um estado de exceção...

Perguntem agora a Humphrey, a Dawkins, a Hamilton ou a Wilson, se suas queridas teorias também são memes... E ouvirão, pasme, que são produto da experiência (mentira porque memes jamais foram experimentados!) ou da ciência! Temos já um templo, igreja ou altar, como sacerdotes e pasme, uma verdade revelada que não procede dos memes... Memes existem apenas para quem não é cientista. Eis aqui uma verdade - Cientistas são imunes a memes. Embora Heisenberg, Fermi, Weizsacker, Schroeder, Einstein, Planck, Lemmaitre, Jeans, Lovell, Eddington, Maxwell, Dirac, Whitehead, Overstreet, Dobzhansky, etc terem sido infectados pelo teísmo... Oh coitados...

Na verdade apenas os cientistas ateístas - e, que pena, ao contrário do que se propaga não são a maioria e sequer muitos - como Dawkins, Wolpert, Stenger e Tryon; por exemplo, são de fato imunes aos memes... enfim privilegiados. Quanto a Freud e Marx, não são reconhecidos como cientistas por eles, e quando ao querido Darwin, apresenta-se claramente como deísta na 'Evolução das espécies' embora, já no fim da vida, influenciado pelo problema da dor ou do mal, tenha se inclinado ao agnosticismo. Sempre bom, dizer que, apesar do que contam os péssimos 'filósofos' (cientistas) ateístas, que o agnosticismo implica uma noção de epistemologia e antropologia absolutamente distintas da epistemologia e antropologia ateísticas, e que apresenta-los como 'ateus' medrosos ou covardes é pura e simples desonestidade, e arrogância é claro. Diga-se isto com mais razão ainda do Panenteísmo, e do deísmo... Nenhum destes conceitos, nenhum deles, equivale mesmo de longe ao ateísmo, mas, estão em franca oposição a ele. O ateísmo é posição tão 'solitária' quanto o agnosticismo e o teísmo (de que Panenteísmo e Deísmo são formas ou variantes).

Portanto ficar elaborando falsas listas de ateus em que constem - Galileu, Newton, Diderot, Voltaire, Darwin, etc implicará sempre, desonestidade, falta de ética e desespero, afinal de houvesse um grande número de sábios e cientistas ateus ou ateus a mancheia, como diziam nossos ancestrais, por que falsear ou fabricar falsos ateus???

Admitida a existência do meme e da paridade entre verdade e erro, tanto o teísmo, quanto o ateísmo, ficam sendo nada ou zero a esquerda... E já estamos nós nas mesmas condições que Pirro ou Hume, i é em estado de ignorância absoluta e invencível, afinal, memes não refletem, não raciocinam, não pensa, não filosofam e não tem acesso a verdade.

Assim há infectados pela crença segundo a qual a alma sobrevive a morte e infectados pela crença, não menos 'inverificável' de que a alma morre com o corpo físico... Um implante aqui, um implante acolá e nada mais...

Outro aspecto insólito a ser considerado é que uma conceito ou entidade cultural se transfigura ou converta em estrutura material, sabe-se lá como... Não se sabe nem se pode saber. Pois se se trata duma ideia como se pode transformar uma molécula ou coisa parecida? Dirá nosso mago que por meio de sinapses neuronais... e no entanto as sinapses neuronais estão na base de todo aprendizado humano, sem que deixe de ser fluídico, flexível, dinâmico e mutável... Pelo simples fato de imigrantes, mesmo já mais velhos ou maduros, mudarem de hábitos quanto instalam-se noutro pais, aderindo a outro tipo de traje, de dieta ou até mesmo de religião... O que mesmo não sendo comum, é empiricamente verificado! Supor a memética é dar o comportamento humano por fixo e imutável, uma aberração!

Torne-mos mais uma vez a sra Robinson:

"Sendo assim como supor uma base genética em qualquer comportamento humano? Se estes memes parecem se ter libertado da dependência direta para com os genes, e aparentemente podem faze-lo ainda onde não o fizeram de fato... Coisa dificil conciliar a sócio biologia, com sua dependência do neo darwinismo gradualista, com esses MEMES INCORPÓREOS QUE FLUTUAM LIVREMENTE, QUE SÃO ALTAMENTE CONTAGIOSOS E QUE, NA TEORIA, de alguma forma, conseguiram fazer com que o nosso cérebro físico se ajustasse a sua própria sobrevivência e propagação." id P 67

Compreenderam???

O cérebro ou a mente não tem qualquer meio para safarem-se a ação colonizadora dos memes... Estamos num mato sem cachorro? Cérebro ou mente não nos garantem nada, não servem para nada... Pois somos presas fáceis de uns memes incorpóreos que flutuam ao sabor da cultura, da mesma forma que a rubeóla ou o sarampo... A conclusão 'ética' é miserável - Você é tão responsável por seu fundamentalismo religioso, por seu racismo, por seu machismo, por seu adultismo, por seu capitalismo, por seu odinismo, enfim por seus preconceitos e superstições, tanto quanto é responsável por contrair crupe, difteria, tifo, rubéola, sarampo, catapora, etc Afinal ainda não foi inventada qualquer vacina contra meme... Estará o grande Richard Dawkins a fabrica-la em seu laboratório???

Resta considerar que toda esta parlenga ou lenga lenga traí, como não poderia deixar de ser o ranço do positivismo, com suma imensa pobreza (a avaliação é de Werner Heisenberg). Um grupinho de cientistas ou de sumos sacerdotes do novo culto, tributado a seleção natural, que enxergam o 'pecado' (no caso da metafísica) em todos, menos neles mesmos, i é nos privilegiados, especiais, superiores ou messias... Lembra K Marx e seu determinismo economicista, segundo o qual a consciência e a cultura eram produto de relações econômicas de produção. E no entanto esse Marx, inserido num modelo de produção capitalista, não era determinado e portanto assimilador daquele modo de pensamento, mas teórico de um novo tipo de pensamento - comunista ou marxista - não determinado por aquele modo de produção majoritário. Marx, como oponente do capitalismo e portador de uma nova consciência, era indeterminado...  Lembra E Durkheim, com seu sociologismo tosco e a respeito de cujas pesquisas e constatações deveríamos perguntar se foram determinadas pelo meio! Lembra Freud, psicologista, que metafisicou a respeito de um fenômeno social, sem quiçá, jamais ter avaliado suas próprias relações afetivas com o pai e a mãe e até que ponto fora influenciado por elas... Dificil para estas homens colocarem-se no plano de suas pŕóprias doutrinas ou situarem-se nelas...

Que dizer então de Dawkins? Teria sido também colonizado por certos memes, portadores das ideologias que tão fanaticamente defende ou seria um privilegiado posto em comunicação com uma verdade oculta a todos os mortais??? Por esta via chegaríamos a mística... E não preciso dizer mais nada! Cada um considere o que seja esta nova 'ciência' da memética e tire suas próprias conclusões!



C Q D

domingo, 4 de março de 2018

Memética, que troço é este??? I

Tal episódio se deu na Era dourada das artes, em Atenas, a Atenas de Fídias, Praxísteles, Polignoto, e é claro Apeles... o qual tinha por costume expor suas telas em praça pública com o objetivo de ouvir os comentários que eram feitos a respeito de seu trabalho.

Numa certa tarde após ter refeito uma de suas obras - Botões, penteado e fivelas dos sapatos - segundo as orientações da costureiro, do cabeleireiro e do sapateiro, aproximou-se novamente o sapateiro arriscando este comentário:

--- Agora estão perfeitos os sapatos, mas esta prega da túnica...

Foi quando Apeles, saindo detrás da tela atalhou:

--- Ne sulor ultra crepidam judicaret, isto é - Sapateiro não passes além dos sapatos!

Outro tanto poderíamos dizer a respeito do sr Richard Dawkins - "Cientista, não passe além dos fatos ou da experiência." ou "Biólogo não passes das provetas e tubos!"

Afinal cuida ele muito teorizar ou metafisicar a respeito de temas que nem de longe dizem respeito a seu campo de investigação... Assim de Deus, do livre arbítrio, da ética, etc apresentando tudo isto como fina flor em termos de ciência. Não, o homem não brinca ou graceja, e proclama em alto e bom som que seu livro sobre os 'genes egoístas', de modo algum é ficção, mas autêntica ciência (cf Flew 'Ediouro' 2008 p 87)... E não chegamos ainda a memética e menos ainda a 'Deus um delírio', pois o homem tudo vende como ciência...

Foge aos fatos em sua rude simplicidade, interpreta, especula, narra, desenvolve, segue pelos domínios da imaginação e da fantasia, como péssimo filósofo que é, e tudo vende como ciência 'positiva' ou factual.

Já dissemos que pela teoria a metafísica renasce, de bem que disfarçada. E já se pode fazer metafísica ateística em nome do positivismo!!! VENDENDO-A COMO FATOS!!! Isto, sejamos justos e honestos, os positivistas não fizeram, ao menos em sua maior parte, permanecendo, muitos deles, no prudente terreno do agnosticismo ou dos fatos. Hoje porém, os homens fazem metafísica com o nome de teoria, e negam que estão a metafisicar, e isto é grave, pelo simples fato de implicar, desonestidade e falsificação.

Ateísmo e materialismo jamais serão dados empíricos ou fatos concretos tomados a natureza por meio da experiência como a lei da conservação da matéria, a incerteza, a relatividade especial, etc Mas construções especulativas ou conclusões que transcendente a experiência pura e simples. São elaborações conceituais ou ideológicas e se os ateístas alegam que tais conclusões dimanam de fatos, os teístas ou deístas não alegam menos...

Alias o problema não é este. Como ser pensantes, Dawkins, Dennett, Harris, Hitchens, Amis, Pullmann, Wolpert, Stenger e demais janízaros do neo ateísmo, sempre poderiam, especular, metafisicar ou filosofar sem precisar oferecer quaisquer justificativas. Afinal nada mais próprio ou característico do Homo sapiens do que refletir ou filosofar. Fazemos isto desde que assumimos um caráter propriamente humano e continuaremos a faze-lo mesmo quando Hume, Kant, Dennett ou outro qualquer declare que não é aconselhável, que não é prudente, que somos incapazes, que não devemos nos preocupar, etc Alias nada mais anti filosófico do que limitar a esfera da reflexão humana, apontando para as 'colunas de Hércules' e declarando jactanciosamente: Não passarás!

O caso é que devemos fazer Filosofia como Filósofos e não vende-la como cientistas... Ser cientista e estar familiarizado com a rotina de um laboratório e suas pesquisas, nada significa em termos de Filosofia. Apresentar-se como filósofo nos domínios da Filosofia só pode significar uma coisa: O desejo consciente ou inconsciente de intimidar o interlocutor colocando-se numa posição de superioridade. É o velho argumento da autoridade que eles mesmos repudiam no âmbito de sua ciência, mas que aspiram inserir nos domínios da Filosofia.

O próprio Sagan, que era suficientemente instruído nos domínios da Filosofia, já havia deixado bem claro que seus pares, caso quisessem teorizar ou metafisicar, deveriam antes de tudo adquirir um aparato conceitual filosófico, e portanto estudar as obras propriamente filosóficas dos Pŕe socráticos a Jaspers ou Maritain, passando por Platão, Aristóteles, Bacon, Descartes, etc. Fato é no entanto que mesmo os Filósofos de fancaria, seguindo certas tradições que remontam a Hume, iniciam suas leituras a partir de Hume e Kant, imaginando que a humanidade começou a pensar com eles e ignorando presunçosamente toda nossa herança grega, romana, medieval e mesmo moderna. Aqui a pressuposição de que tudo quanto fora dito ou escrito antes seria lixo...

Quando aos neo ateístas, parecem não ter estudado seriamente nem mesmo a Hume, cujos argumentos reproduzem cá e acolá, e Kant...

A superficialidade com que Dawkins considera as vias que Aquino tomou a Aristóteles é supinamente vergonhosa, mormente quando foram magistralmente reelaboradas pelo Bispo Fulton Scheen no livro 'Filosofia da religião' (Edição Brasileira da Agir) publicado a mais de meio século. Cito isto apenas de passagem. De modo geral o conhecimento dos conceitos e categorias, da linguagem filosófica propriamente dita, da arqueologia das ideias, dos autores, etc pelos metafísicos ateístas deixa muito a desejar. É como se sequer tivessem estudado Filosofia, Sociologia ou Psicologia no ensino médio ou folheado um livro didático... E são escritores de fama mundial, promovidos pelo mercado editorial, e seguidos por multidões de crentes ou devotos, não menos que o papa romano ou o dalai lama...

Então o que eu esperaria ao abrir uma dessas obras?

Simples - Uma abordagem corajosa, ousada, direta, franca, de cada um dos argumentos ou evidências envolvidos, e sobretudo amplo conhecimento de causa em termos filosóficos, e não afirmações enfáticas - as quais sempre fazem lembrar a 'bíblia' protestante ou o corão - do tipo: Não nos devemos importar com isto! Não nos devemos preocupar com esta questão! Não devemos abordar este problema... Também não me satisfaz a confissão honesta de um Dawkins ou de um Pinker - a respeito da consciência ou da auto percepção - "Nem Steve Pinker nem eu podemos explicar a consciência subjetiva humana, a qual os filósofos chamam 'qualia'... Steve aborda o tema e se pergunta de onde a consciência procede e o que é. E é bastante honesto ao dizer que não sabe. Eu digo o mesmo. Não sabemos. Não compreendemos." Flew 162, de memória.

E no entanto buscamos respostas! Pugnamos, demandamos por respostas! Queremos respostas! Muito bem, o sr Dawkins declara não te-las, então por que raios faz tanta gala de seu ateísmo, jurando QUASE saber que não existe Inteligência ou consciência superior??? Sua ignorância manifesta não devia força-lo a uma posição mais prudente? O homem alega não saber o que é a consciência que temos e já se aventura a negara a hipótese de que uma Mente superior as nossas seja fonte deste fenômeno cuja origem ele supinamente ignora! Ele dirá que apelamos a um Deus de lacunas, podemos bem responder que temos um ateísmo presumidamente cientificista que ignora as lacunas da própria ciência... Seja como for os ateístas não seriam menos prudentes do que nós...

A impressão é aparente. Pois como a matéria bruta não possuí nem de longe qualquer capacidade semelhante a auto percepção, é plenamente justificado, atribuir ao fenômeno supra sensível da consciência, e assim o da racionalidade, a uma causa do mesmo gênero. Se temos fenômenos mentais irredutíveis a materialidade pura e simples - aqui um parentesis: Pavlov, Penfield, Eccles/Popper, Schroeder, Steven Rose... dentre outros tem esclarecido seus leitores a respeito de que a identidade mente cérebro não foi demonstrada, Pavlov por sinal, no fim de sua existência fora pressionado pelo Partido comunista para declarar que a identidade mente cérebro fora cabalmente demonstrada pela ciência, mas, preferindo ser honesto, declinou...

Dizer que o elemento material se auto organizou, acidentalmente ou por golpe de sorte, com o objetivo de produzir o fenômeno da auto percepção parece beirar a insanidade. Afinal como a matéria se poderia ter organizado sem ser racional? Como poderia se ter imposto um fim se não é dotada de vontade própria? Como poderia ter atingido este fim acidentalmente ou por meio da sorte, i é do mero acaso? Por outro lado se a auto percepção é propriedade inerente a matéria estamos dispostos a admitir que as pedras tem consciência de si mesmas ou que os neutrons, protons e eletrons são dotados de vontade própria? Que partículas, átomos, células e pedaços de matéria bruta pensam, desejam, projetam, concebem, etc???

Não me estenderei sobre uma questão a respeito da qual Dawkins confessa sua supina ignorância. Mas não posso deixar passar desapercebidamente aquele trecho famoso em que ele declara, muito seriamente, declara que a primeira célula viva surgiu PARA a seleção natural... Vejam temos aqui uma finalidade ou um propósito para a vida, a seleção natural... Compreende o leitor a dimensão do que diz o Dr Dawkins??? Segundo a teologia natural foi o homem - enquanto se auto percipiente, racional e livre - planejado por uma consciência ou uma mente para realizar tais potencialidade e tornar-se feliz. Agora veja só meu senhor, que este ateísmo caviar ou nutella, repudia a existência da mente mas mantém, oh suprema incoerência, não apenas o desígnio ou o sentido, mas como dirá A C Grayling, resíduos de uma escatologia cristã triunfalista ou positiva.

Agora veja a Santa divindade substituída pelo princípio da Seleção Natural, a qual nosso homem atrela a velha mística positivista do progresso... Pela Seleção natural a ciência, e através dela ao paraíso terrestre... Há uma direção certa que não poderia a haver...

Confesso não saber que pensar sobre isto.

A saber sobre um Biólogo de fama internacional e sucessivamente premiado que falseia a própria teoria da Evolução ignorando a construção da teoria sintética e procedendo como se pertencesse a última quadra do século XIX... Dawkins atua como se Weismann, De Vries e Batenson jamais tivessem existido. Nada de Dobzhansky ou Mayr... Tudo quando o mistagogo inglês deseja é conformar a genética com a 'seleção natural' de Darwin ou criar uma genética darwiniana. Adaptar a genética a um princípio que ja transformou em místico! Claro que tudo isto é construção ideológica. Os criacionistas, mesmo quando alegam estar pesquisando seriamente, jamais deixam de partir do Gênesis, os darwinianos mesmo quando pesquisando não deixam de partir de Darwin, mas não se trata de hipótese testável mas de crenças ou ideias fixas, assim fica fácil torcer e selecionar os fatos produzindo toda uma metafísica, assim o 'Gêne egoísta', porque os genes não podem fugir a seleção natural de Darwin, devem a fina força concordar com ela...

E no entanto a Evolução não se dá, e até um garoto dos bancos escolares devería sabe-lo para estar imunizado, por meio da seleção natural somente, mas por meio das mutações genéticas - Batenson e De Vries. Quando li em Flew queo fator deificado por Dawkins nada produz já o sabia há muito tempo por ter lido Newton Freire Maia. De fato a seleção para atuar depende da 'matéria' produzida, ou da célula alterada, por um evento 'estocástico' a principio, chamado mutação. A mutação é o elemento chave ou positivo da Evolução Biológica, o qual fornece conteúdo a seleção natural e sua dinâmica ou melhor suas leis. Mas Dawkins nada quer saber de mutação, de modo que ela não entre em seu esquema metafísico... Tudo ali é operado ou feito pela seleção, a qual assume o caráter de força maǵica, ou melhor dizendo de um deus...

E face a este deus onipotente que fica sendo o homem???

Nada mesmo que nada, ao menos no que tem de seu ou próprio.

Começando por perder seu livre arbítrio como desejado pelo falecido B F Skinner...

Vejamos então que é o 'Animal racional' ou que fica sendo face a escolástica biológica ou melhor darwiniana do sr Dawkins, o qual bem merece nosso Verbi gratia -

"Somos máquinas de sobrevivência, veículos, robôs cegamente programados para preservar essas moléculas egoístas a que chamamos genes." Flew 87 e foi a propósito disto que ele declarou não estar fazendo ficção mas ciência... id

E no entanto sabemos e muito bem que robôs, máquinas, veículos, marionetes, bonecos, etc não conhecem ética ou moralidade. Falar em moralidade para uma máquina faria tanto sentido quanto falar em moralidade para uma figueira ou um carrapato... Temos aqui, mais um vez o ideal anti ético do positivismo ou melhor de Litreé. Chegamos aos domínios do relativismo e do subjetivismo crassos que justificariam todas as ações de um Ravachol... As partes virtuosas ou oportunistas da humanidade tiveram de berrar... E Dawkins como Wilson antes dele, de dizer que havia sido mal interpretado!

Foi honesto???

Não o sei. Só sei que algum tempo depois voltou a carga - "O argumento de meu livro é que nós, e todos os outros animais, somos máquinas criadas por nossos genes.". Os genes aqui são como deuses ou anjos a serviço da lei ou do legislador supremo que é a Seleção natural...

Outra não é a opinião de seu emissário ou porta voz, o falastrão Pinker, que continuando a obra nociva de Skinner no campo da nossa Psicologia - Leiam todos as respostas que lhe foi dadas por Horgan e Rose - faz guerra ao conceito de livre vontade ou livre arbítrio, o tema por assim dizer, central, da Filosofia segundo I Kant.

Agora qual o significado preciso de tudo isto amigo leitor?

Demos mais uma vez a palavra a Antony Flew:

"Para Dawkins, o principal meio de produzir o comportamento humano é atribuir aos genes características que possam, de modo significativo, SER ATRIBUÍDAS A PESSOAS. Então, depois de insistir que nós somos criaturas de nossos genes, e que por isto não temos escolha, sugere que não podemos fazer outra coisa a não ser aceitar as características pessoais desagradáveis daquelas mônadas que tudo controlam." Flew 87

Bem antes de termos lido Flew, já dizíamos - O homem transforma a seleção numa deusa e os genes em homens! Antropomorfiza nossos genes atribuindo-lhes a intencionalidade que nos pertence, transfere a deliberação do ser racional para partículas moleculares!

E esse mesmo homem que enfia atributos precipuamente humanos em nossas células ou genes, nega tudo quanto nos diferencia dos outros animais... Máquinas são máquinas e todos somos máquinas, aqui um fusca, ali uma Brasília e mais além um Monza... nenhuma diferença essencial.

E esse mesmo cientista 'magnífico' que vê racionalidade e intencionalidade em genes, é incapaz de prestar mais atenção em sua 'deusa' a seleção natural, de de refletir mais detidamente sobre o fato de achar-se diante de um fenômeno regular direcionado para um determinado fim - como o próprio processo evolutivo por sinal. A existência da regularidade, da constância, da direção, do fluxo, significado pelo conceito de lei não lhe diz absolutamente nada, e ele chega a acreditar que as leis constituem ou dão origem a si mesmas... Sem se perguntar sobre o 'pôrque' de continuarem a vigorar indefinidamente ou sobre de onde tiram suas 'forças'...